Eram sete da manha, o frio ainda apertava, apesar de estarmos no pico do Verão. Com uma ligeira dor de costas, arrastei-me calmamente do meu carro. A princípio foi difícil, pois teimei em sair do banco do pendura, pela porta do condutor, mas com alguma ginástica lá cheguei a bom porto. A noite tinha sido meio complicada, ao lado, um grupo de amigos ainda dormia no local de onde eu fugira durante a noite. Olho em volta e sento-me agora sobre a frente do carro, reclino-me ligeiramente para trás e admiro tudo o que passa por cima de mim, esta era uma perspectiva diferente mas não menos original.
Ele eram enormes pinheiros que se dobravam e amavelmente me diziam bom dia, bandos de pássaros que cantavam num coro, descoordenado mas melódico, em harmonia, pinhas que competiam a ver qual delas chegavam mais depressa ao solo, pequenas brisas de vento que voavam os mil metros, entre arvores, tentando fazer mínimos para os jogos olímpicos da Patagónia, enfim, ali deitado dei por mim a relembrar e a pensar, que de facto aquelas coisas verdes que estavam plantadas no chão, não deviam ser mesmo para fumar…adormeci…dormi…acordei, e a minha frente já não tinha um cenário fantástico, mas um outro que só consigo descrever como paradisíaco. Sol abundante, vento em forma de leve e reconfortante brisa, um mar absolutamente azul, e uma areia fina e granulada, que graciosamente me amparava o corpo. Esta é de facto, a descrição de um local transcendente.
Por momentos fiquei a admirar, impávido e sereno, aquele cenário, o quadro foi abrindo, o som foi voltando, as vozes de longe vieram para perto. De repente já não estava sozinho, o barulho, já não era nem da brisa, nem das ondas do mar. Era um barulho, mais real, mais mundano, mais terreno, mais humano, a neblina ocular dissipou-se por completo e vi, o mesmo cenário, a mesma ambiência, mas rodeado de pessoas, grandes pessoas, grandes corações, grandes amigos. Estava rodeado de grandes amigos, e de umas outras pessoas que nunca tinha visto, mas a quem também não perguntei o nome. Ali sim, tive a certeza que, estava de facto acordado, e não num qualquer mundo paralelo de sonhos e fantasias.
Enquanto uns partiam para dentro de agua, eu avancei calmamente pela areia que ainda resmungava um pouco quando era pisada, avancei um pouco mais e sentei-me a beira mar a admirar aquilo que é mais bonito nesta vida, a amizade, os amigos, se bem que naquele momento, a felicidade momentânea deu lugar a um certo sentimento de tristeza, vazio e angustia, porque não estavam todos ali, a ausência é um sentimento difícil de preencher, se não tiver de todo nas nossas mão a sua resolução, mas foi então, que percebi a enorme metáfora onde estava metido. Aquele cenário a roçar o edílico, era a compensação e a lembrança dos amigos ausentes, foi com esta ideia que voltei a sorrir, com um sorriso me deixei levar, e finalmente adormeci…dormi…acordei, o vento lá fora esta forte, a temperatura já ronda o vão de escada, a chuva cai intensamente sobre os estores e lembra uma melodia tipicamente outonal, em memoria de um Verão que já lá vai. De chávena, de chá quente, em punho, avanço para a minha pequena janela para o mundo e relembro um admirável dia de Verão, que já não sei se aconteceu, ou se eu o sonhei assim, mas é sempre bom pensar que existem momentos muito bons nas nossas vidas, mesmo que lá fora a chuva cai intensamente, e que o sol não nos consiga iluminar…

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